VERSOS E QUADRAS


Sei que pareço um ladrão…
mas há muitos que eu conheço                                                                                                                   que, sem parecer o que são,
são aquilo que eu pareço!
'' António Aleixo''


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FEITO EM 1934.
Conta-se que este poema foi dirigido ao Ministro da Agricultura do governo
de Salazar, como forma de pedir adubos. Por mais estranho que pareça, o
senhor que o escreveu não foi preso e Salazar até se fartou de rir (??!!!)
quando o leu:
- E X P O S I Ç Ã O -
 Porque julgamos digna de registo
a nossa exposição, senhor Ministro,
erguemos até vós, humildemente,
uma toada uníssona e plangente
em que evitámos o menor deslize
e em que damos razão da nossa crise.

Senhor: Em vão, esta província inteira,
desmoita, lavra, atalha a sementeira,
suando até à fralda da camisa.
Falta a matéria orgânica precisa
na terra, que é delgada e sempre fraca!
- A matéria, em questão, chama-se caca.

Precisamos de merda, senhor Soisa!...
E nunca precisámos de outra coisa.

Se os membros desse ilustre ministério
querem tomar o nosso caso a sério,
se é nobre o sentimento que os anima,
mandem cagar-nos toda a gente em cima
dos maninhos torrões de cada herdade.
E mijem-nos, também, por caridade!

O senhor Oliveira Salazar
quando tiver vontade de cagar
venha até nós solícito, calado,
busque um terreno que estiver lavrado,
deite as calças abaixo com sossego,
ajeite o cú bem apontado ao rego,
e... como Presidente do Conselho,
queira espremer-se até ficar vermelho!

A Nação confiou-lhe os seus destinos?...
Então, comprima, aperte os intestinos;
se lhe escapar um traque, não se importe,
... quem sabe se o cheira-lo nos dá sorte?
Quantos porão as suas esperanças
n'um traque do Ministro das Finanças?...
E quem vier aflito, sem recursos,
Já não distingue os traques dos discursos.

Não precisa falar! Tenha a certeza
que a nossa maior fonte de riqueza,
desde as grandes herdades às courelas,
provém da merda que juntarmos n'elas.

Precisamos de merda, senhor Soisa!...
E nunca precisámos de outra coisa.

Adubos de potassa?... Cal?... Azote?...
Tragam-nos merda pura, do bispote!
E todos os penicos portugueses
durante, pelo menos uns seis meses,
sobre o montado, sobre a terra campa,
continuamente nos despejem trampa!

Terras alentejanas, terras nuas;
desespero de arados e charruas,
quem as compra ou arrenda ou quem as herda
sente a paixão nostálgica da merda...

Precisamos de merda, senhor Soisa!...
E nunca precisámos de outra coisa.

Ah!... Merda grossa e fina! Merda boa
das inúteis retretes de Lisboa!...
Como é triste saber que todos vós
Andais cagando sem pensar em nós!

Se querem fomentar a agricultura
mandem vir muita gente com soltura.
Nós daremos o trigo em larga escala,
pois até nos faz conta a merda rala.

Venham todas as merdas à vontade,
não faremos questão da qualidade.
Formas normais ou formas esquisitas!
E, desde o cagalhão às caganitas,
desde a pequena poia à grande bosta,
de tudo o que vier, a gente gosta.

Precisamos de merda, senhor Soisa!...
E nunca precisámos de outra coisa.


Pela Junta Corporativa dos Sindicatos Reunidos, do Norte, Centro e Sul do
Alentejo


Évora, 13 de Fevereiro de 1934


O Presidente

D. Tancredo (O Lavrador)
ADAPTAÇÃO MODERNA DOS LUSÍADAS

I
As sarnas de barões todos inchados
Eleitos pela plebe lusitana
Que agora se encontram instalados
Fazendo aquilo que lhes dá na gana
Nos seus poleiros bem engalanados,
Mais do que permite a decência humana,
Olvidam-se de quanto proclamaram
Em campanhas com que nos enganaram!

II
E também as jogadas habilidosas
Daqueles tais que foram dilatando
Contas bancárias ignominiosas,
Do Minho ao Algarve tudo devastando,
Guardam para si as coisas valiosas.
Desprezam quem de fome vai chorando!
Gritando levarei, se tiver arte,
Esta falta de vergonha a toda a parte!

III
Falem da crise grega todo o ano!
E das aflições que à Europa deram;
Calem-se aqueles que por engano.
Votaram no refugo que elegeram!
Que a mim mete-me nojo o peito ufano
De crápulas que só enriqueceram
Com a prática de trafulhice tanta
Que andarem à solta só me espanta.

IV
E vós, ninfas do Coura onde eu nado
Por quem sempre senti carinho ardente
Não me deixeis agora abandonado
E concedei engenho à minha mente,
De modo a que possa, convosco ao lado,
Desmascarar de forma eloquente
Aqueles que já têm no seu gene
A besta horrível do poder perene!

QUADRAS DO S. JOÃO

Dancei com tão pouca arte

Que até o cravo ao meu peito,

Com o teu, num baile à parte,

Mostrou que tinha mais jeito!



Solteira não sei se fico,

Mas por casar-me não corro:

Não vou dar um manjerico,

Em troca de um alho-porro!



Ver os balões na subida,

Mostrando ao mundo a fachada,

Faz lembrar os que na vida,

Sobem cheiinhos de nada!



Maria ao ir hoje à fonte,

Tão afoita e sem rodilha,

Por certo tinha no monte,

Quem lhe desse um jeito à bilha!



Brincaste no S. João,

Com quem bem te apeteceu;

Agora, tens um balão,

E não sabes quem to deu!



Nesta rusga em que eu vou,

Que contraste mais ardente!





Quando mais liberto estou,

Mais me prendo a esta gente!



Nenhum trevo faz feliz,

Quem na vida, por escolha,

Troca a sorte da raiz,

Pela sedução da folha!



Tenho uma cascata linda,

Em forma de uma capela,

Mas não encontrei ainda,

O santo que hei-de por nela!



Não enxovalhes a fonte,

Onde já te saciaste,

Não suceda que ela conte,

A sede que lhe deixaste!



Quem me dera ser diferente:

Ser chama de um fogo eleito,

Subir balão, de repente,

Cair brasa, no teu peito!



Meu derradeiro desejo,

Nesta vida tão ingrata,

É ter rusga por cortejo,

E por campa uma cascata!

Certas vidas me comovem,

Como balões se parecem:

São bem-vistos quando sobem,

Ninguém os vê quando descem!



O povo, ainda que pobre,

Faz uma rusga modesta…

O rico, embora lhe sobre,

Nem sempre faz melhor a festa!



Com o fogo nas entranhas,

Sobem os balões no ar.

Também as tuas patranhas,

Me fizeram levitar!



As meninas dos meus olhos,

Até dançavam pecados,

Quando tu, de saia aos folhos,

Tinhas gestos descuidados!



Erguem cascata modesta,

Meninos pobres, que são,

Os balõeszinhos da festa,

Que a vida prende no chão!



Menina pôs na janela,

Dois balõezinhos. Depois,

Quando se debruçou nela,

Pôs na janela outros dois!

Porque secou infeliz,

Meu manjerico eu bem sei,

A quem dei – não o quis,

A quem o quis – não o dei!



Por sobre a erva pisada,

Com a tua perna ao léu,

Não precisei de mais nada,

Para ver estrelas no céu!



A fonte do monte chora,

E com razão, se não vede:

Quem lá bebe vai embora,

Sem ver se a deixou com sede…



Nos trevos a sorte existe,

Sejam de quatro ou de menos:

A melhor sorte consiste,

Em aceitar a que temos!



Atrás de trevos aos molhos,

Que só me deram azar,

Deixei fugir dos meus olhos,

A sorte que era meu par!



Não chores por ter par,

Porque não faltam chinelas,

Em qualquer canto a esperar,

Os pés descalços sem elas…

Os sonhos da nossa vida,

Fazem lembrar, S. João,

Aquela fogueira erguida,

Que acaba em cinzas no chão…



O amor como os balões,

Têm os mesmos desvarios,

Enchem com as ilusões,

Depressa ficam vazios!



Se nestas rusgas de agora,

Tu não dançares com jeito,

Logo verás, sem demora,

O teu cravo noutro peito!



S. João, tu tens razão:

Não há rusga como esta!

Esteve o povo sem tostão,

É quem faz melhor a festa…



Num simples passo de vento,

Meu travesso manjerico,

Pôs-me os balões ao relento,

No meio do bailarico!



A vida é roda onde a dança,

A agente anda a aprender,

Quanto mais idade alcança,

Mais voltas ficas a saber…

Eu ia de saia aos folhos…

Passaste… virei rainha.

Mas onde deitaste os olhos,

Foi nos balões da vizinha…



Não me peças que te conte,

As fogueiras que já fiz;

Por muito que ouças a fonte,

Nunca entendes o que diz!



Dancei com tanto receio,

Que só o meu alecrim,

Provou, beijando o teu seio,

A sorte que era para mim…



Tantas fogueiras saltaste,

E tantas voltinhas deste,

Que nem a prova tiraste,

Às contas que não fizeste!



Dizem os velhos do Restelo,

Que o S. João está morto.

Mentira! Venham cá vê-lo,

Nas ruas do nosso Porto.



De saia curta a bailar,

Qualquer mulher, por condão,

Põe de cabeça no ar,

Quem anda atrás do balão!



Meu amor, dou-te um conselho,

E podes tirar a prova:

-O trevo dum homem velho,

Dá sorte à mulher mais nova!



Sou fonte de mal goteja,

Sequei-me num longo estio,

Mas quem minha água deseja,

Ainda nela encontra um fio.



A cidade vendo junta,

Imanada nesta festa,

Ocorre-me uma pergunta:

-Onde há gente como esta?



Meu derradeiro desejo,

Nesta vida tão ingrata,

É ter rusga por cortejo,

E por campa uma cascata.



Não me mandes balõezinhos,

Que não tenho onde os guardar:

Atira-me antes beijinhos,

Que não ocupam lugar!



O tempo por nós passou,

E das fogueiras que fomos,

Brasido apenas ficou,

Para avivar o que somos.



Fosse lá pelo que fosse,

São João mal te viu,

Do seu altar debruçou-se,

E, por um triz, não caiu.



Há tanta dança atrevida,

Que muita gente até crê,

Que S. João de fugida,

Passa e finge que não vê!



Entrei na festa, atrevida,

Sem ligar aos bons conselhos,

Mas vi que a festa da vida,

Tem o sabor dos mais velhos.



A fonte é como a mulher.

Cada qual a mais querida.

Quem fonte e mulher tiver,

Não passa sede na vida!



Quando a Maria arregaça,

Na roda, a saia de folhos,

Põe mil fogueiras na praça,

A arder noutros tantos olhos…



O meu Zé coo martelinho,

Deu-me de leve na testa;

Depois, tomou-lhe o gostinho,

Fez de mim o bombo de festa!



Há quem procure na vida,

Trevos da sorte e não veja,

Que tem em si, escondida,

A sorte que outro deseja.



Eu sou o povo que canta,

A noite de São João!

Tirei cravos da garganta,

Sai-me a voz do coração!



Tanta pancada levei,

Do teu nobre martelinho,

Que, de tonto, já não sei,

Ir para casa sozinho.



Sou fogueira por paixão,

Foguete, por alegria;

Zé Pereira no S. João,

Zé ninguém no dia-a-dia!



Não leves saia travada,

Na noite de S. João:

É já meia caminhada,

Se ela se abrir em balão.


Poema erótico de Drummond de Andrade

'Satânico é meu pensamento a teu respeito, e ardente é o meu desejo
de apertar-te em minha mão, numa sede de vingança incontestável pelo que me
fizeste ontem.
A noite era quente e calma e eu estava em minha cama, quando,
sorrateiramente, te aproximaste. Encostaste o teu corpo sem roupa no
meu corpo nu, sem o mínimo pudor! Percebendo minha aparente indiferença,
aconchegaste-te a mim e mordeste-me sem escrúpulos. Até nos mais íntimos
lugares. Eu adormeci.
Hoje quando acordei, procurei-te numa ânsia ardente, mas em vão. Deixaste em
meu corpo e no lençol provas irrefutáveis do  que entre nós ocorreu durante
a noite.
Esta noite recolho-me mais cedo, para na mesma cama te esperar. Quando
chegares, quero te agarrar com avidez e  força. Quero te apertar com todas as
forças de minhas mãos. Só descansarei quando vir sair o sangue quente do teu
corpo.
Só assim, livrar-me-ei de ti, mosquito Filho da Puta! '